sábado, 27 de agosto de 2011

Anton Makarenko - O professor do coletivo


Anton Makarenko - O professor do coletivo


O mestre ucraniano Anton Makarenko concebeu um modelo de escola baseado na vida em grupo, na autogestão, no trabalho e na disciplina que contribuiu para a recuperação de jovens infratores

Nova Escola
"É preciso mostrar aos alunos que o trabalho e a vida deles são uma parte do trabalho e da vida do país". Foto: Alexandre Sassaki
"É preciso mostrar aos alunos que o trabalho e a vida deles são uma parte do trabalho e da vida do país" Foto: Alexandre Sassaki
Imagine um educador que tem como missão dirigir um colégio interno (na zona rural) cheio de crianças e jovens infratores, muitos órfãos, que mal sabiam ler e escrever, numa época em que o modelo de escola e de sociedade estavam em xeque. Como educar? Por onde começar? Anton Semionovich Makarenko, professor na Ucrânia, país do leste europeu que era parte da União Soviética na época, foi um dos homens que ajudaram a responder a essas questões e a repensar o papel da escola e da família na recém-criada sociedade comunista, no início do século 20. Sua pedagogia tornou-se conhecida por transformar centenas de crianças e adolescentes marginalizados em cidadãos.

O método criado por ele era uma novidade porque organizava a escola como coletividade e levava em conta os sentimentos dos alunos na busca pela felicidade aliás, um conceito que só teria sentido se fosse para todos. O que importava eram os interesses da comunidade e a criança tinha privilégios impensáveis na época, como opinar e discutir suas necessidades no universo escolar. "Foi a primeira vez que a infância foi encarada com respeito e direitos", diz Cecília da Silveira Luedemann, educadora e autora do livro Anton Makarenko, Vida e Obra A Pedagogia na Revolução.

Mais que educar, com rigidez e disciplina, ele quis formar personalidades, criar pessoas conscientes de seu papel político, cultas, sadias e que se tornassem trabalhadores preocupados com o bem-estar do grupo, ou seja, solidários. Na sociedade socialista de então, o trabalho era considerado essencial para a formação do homem, não apenas um valor econômico. Makarenko aprendeu tudo na prática, na base de acertos e erros, primeiro na escola da Colônia Gorki e, em seguida, na Comuna Dzerjinski. Cada etapa de suas experiências foi registrada em relatórios, textos e livros. As dificuldades e os desafios têm muitos paralelos com os dos professores de hoje. A saída encontrada há quase um século correspondia às necessidades da época, mas servem de reflexão para buscar soluções atuais e entender a educação no mundo.

Proteger a infância
A idéia do coletivo surge como respeito a cada aluno, oposta à visão de massificação que despersonaliza a criança. O grupo estimula o desenvolvimento individual. Como a instituição familiar (e tudo o mais na então União Soviética) estava em crise, essa foi a alternativa encontrada pelo educador para proteger a infância de seu país. O sentimento de grupo não era uma idéia abstrata. Tinha raízes nos ideais revolucionários e Makarenko soube como transformá-la em algo concreto. A colônia era auto-suficiente e a sobrevivência de cada um dependia do trabalho de todos. Caso contrário, não haveria comida nem condições de habitação aceitáveis.

Valorizar a disciplina

Para que a vida em comunidade desse certo, era essencial que cada aluno tivesse claras suas responsabilidades. "Nunca mais ladrões nem mendigos: somos os dirigentes." Makarenko era conhecido como um educador aberto, mas rígido e duro. Ele acreditava que o planejamento e o cumprimento das metas estabelecidas por todos só se concretizariam com uma direção muito firme. Por isso, os alunos tinham consciência de que a disciplina não era um fim, mas um meio para o sucesso da vida na escola. O descumprimento de uma norma podia ser punido severamente, desde que alunos e professores assim o desejassem, depois de muita discussão.

Envolver a família
Makarenko publicou em 1938, incompleto, o Livro dos Pais. O objetivo era mostrar a importância da participação da família na escola e como educar as crianças em tempos difíceis. Alguns estudantes moravam nas escolas dirigidas por ele. O educador ucraniano fazia questão da presença dos pais, que eram estimulados a participar de atividades culturais e recreativas. A escola tinha o papel de orientar a família, que deveria encará-la como um órgão normativo. Pais muito "melosos" ou ausentes seriam incapazes de educar uma pessoa forte, madura e inteligente. "O carinho, como o jogo e a comida, exige certa dosagem", dizia.

Makarenko na escola: o aluno ganha voz
O trabalho em oficinas fazia parte do método: recurso para a autogestão da escola
O trabalho em oficinas fazia parte do método: recurso
para a autogestão da escola
Makarenko queria formar crianças capazes de dirigir a própria vida no presente e a vida do país no futuro. Exercícios físicos, trabalhos manuais, recreação, excursões, aulas de música e idas ao teatro faziam parte da rotina. A escola tinha que permitir o contato com a sociedade e com a natureza, ou seja, ser um lugar para o jovem viver a realidade concreta e participar das decisões sociais. O estudo do meio já era comum na escola de Makarenko, ainda que sem esse nome. Na Colônia Gorki, meninos e meninas eram divididos em grupos de dez, de diferentes faixas etárias. Um representante de cada turma participava de assembléias e reuniões em que se discutiam as situações da escola: um objeto roubado, a melhoria do prédio, a compra de materiais, a limpeza dos banheiros, os problemas particulares. Sexo e namoro também tinham espaço nas reuniões. Normas e decisões não podiam ser predeterminadas. O primeiro e o último voto eram sempre dos alunos.

Um tempo de transformações
"Você já se alistou como
voluntário?": cartaz convoca
trabalhadores para defender
a Revolução Russa.
Foto: Divulgação Centro
Cultural Banco do Brasil
Anton Makarenko viveu as grandes transformações históricas do fim do século 19 e do começo do 20: o nascimento das grandes cidades e suas indústrias, as longas jornadas de trabalho, os movimentos revolucionários contra o império do czar Nicolau II, a Primeira Guerra Mundial e a revolução de outubro de 1917 que pôs fim à monarquia e instituiu a ditadura do proletariado na União Soviética. Em meio a tantas mudanças, o papel da criança, dos pais e da escola também estava em xeque. Que ser humano formar para viver nesse novo mundo? Makarenko conhecia, na prática, as necessidades da grande massa pobre da Ucrânia. Seus problemas não eram diferentes dos enfrentados hoje: a carência afetiva e material dos filhos dos operários; a audácia dos filhos dos burocratas, que não queriam fazer os trabalhos manuais e intelectuais, tão valorizados na sociedade socialista; e a ausência da família. Por isso, ele acreditava que a escola tinha que formar seres participativos por meio de uma organização coletiva e democrática, com muita disciplina e trabalho. E os pais que não conseguiam educar seus filhos deveriam ser reeducados por essa escola.
Biografia

Anton Semionovich Makarenko nasceu em 1888 na Ucrânia, filho de um operário ferroviário e de uma dona de casa. Aprendeu a ler e escrever com a mãe, como a maioria das crianças da época, e logo depois foi matriculado numa escola primária. Lá teve acesso às disciplinas de Língua Russa, Aritmética, Geografia, História, Ciências Naturais, Física, Desenho, Canto, Ginástica e Catecismo, mas não pôde estudar sua língua materna, a ucraniana, proibida pelo império czarista na Rússia, nem Lógica e Filosofia, exclusivas da elite. Aos 17 anos, Makarenko concluiu o curso de Magistério e entrou em contato com as idéias revolucionárias de Lênin e Máximo Gorki, que influenciaram sua visão de mundo e de educação. Sua primeira experiência em sala de aula ocorreu em 1906, na Escola Primária das Oficinas Ferroviárias, onde lecionou por oito anos. Em seguida assumiu a direção de uma escola secundária. Mais consciente do modelo de educação que queria aplicar, ampliou o espaço cultural e mudou o currículo com a ajuda de pais e professores. E estabeleceu o ensino da língua ucraniana. Sua mais marcante experiência deu-se de 1920 a 1928, na direção da Colônia Gorki, instituição rural que atendia crianças e jovens órfãos que haviam vivido na marginalidade. Lá ele pôs em prática um ensino que privilegiava a vida em comunidade, a participação da criança na organização da escola, o trabalho e a disciplina. Publicou novelas, peças de teatro e livros sobre educação, sendo Poema Pedagógico o mais importante. Morreu de ataque cardíaco durante uma viagem de trem em 1939, ano que ficaria marcado pelo início da Segunda Guerra Mundial.
Para pensar

Makarenko talvez tenha sido o educador que levou às conseqüências mais radicais as questões do espírito de grupo e do trabalho coletivo. Tudo era discutido entre alunos, professores e a direção da Colônia Gorki e da Comuna Dzerzinski. Por essa razão, embora tenha vivido numa época e num contexto totalmente diferentes dos atuais, vale a pena conhecer suas idéias e pensar sobre elas. Mas será que as crianças e os jovens atuais conhecem de fato o significado de grupo? Ou a idéia de coletivo é abstrata? Os jovens se sentem responsáveis pela escola e pelo bem-estar de seus colegas? "Precisamos pensar se estamos formando pessoas cada vez mais individualistas ou coletivas", diz a educadora Cecília da Silveira Luedemann. Estamos realmente educando para a colaboração e a solidariedade?

A obra de Makarenko provoca ainda uma reflexão sobre a disciplina.

Estamos sendo permissivos demais? Como atingir o equilíbrio entre limites e liberdade? Makarenko dá algumas respostas. Podemos não concordar totalmente com elas, mas é inegável que seu trabalho produziu resultados positivos num momento de grandes dificuldades sociais. Não estaremos nós em momento equivalente?
Quer saber mais?
Anton Makarenko, Vida e Obra A Pedagogia na Revolução, Cecília da Silveira Luedemann, 432 págs., Ed. Expressão Popular, tel. (0_ _11) 3105-9500, 15 reais
Poema Pedagógico, 3 vols., Anton Makarenko, Ed. Brasiliense, 1983 (disponível apenas em bibliotecas)
Conferências sobre Educação Infantil, Anton Makarenko, Ed. Moraes, 1981 (disponível apenas em bibliotecas)
Nova Escola

O Caso dos Universos Paralelos


O Caso dos Universos Paralelos


Por que o multiverso, por mais estranho que possa parecer, é uma idéia científica sólida? Bem-vindo ao multiverso

Alexander Vilenkin
O universo assim como o conhecemos originou-se de uma grande explosão que denominamos de big bang. Por quase um século, os cosmologistas vêm estudando o que aconteceu após essa explosão: como o universo se expandiu e se resfriou e como as galáxias foram gradualmente agrupadas pela gravidade. A natureza da explosão em si se tornou foco de pesquisas somente recentemente. Ela é o assunto da teoria da inflação, a qual foi desenvolvida em meados de 1980 por Alan Guth, Andrei Linde e outros, levando a uma nova e radical visão do universo.
A inflação é um período de expansão superrápida e acelerada na história cósmica primitiva. É tão rápida que numa fração de segundos uma pequena partícula subatômica é inflada a dimensões muito maiores que toda uma região observada naquele momento. No final do processo de inflação, a energia que direciona a expansão dá origem a uma bola de fogo de partículas e de radiação. Isso é o que chamamos de big bang.

O término da inflação é iniciado pelo quantum, pelos processos probabilísticos, e não ocorre em todos os lugares ao mesmo tempo. Em nossa vizinhança cósmica, a inflação terminou há 13,7 bilhões de anos, mas ainda continua em partes remotas do universo, e outras regiões "normais", como a nossa, estão constantemente sendo formadas. As novas regiões parecem-se como bolhas pequenas e microscópicas, e começam a crescer imediatamente. As bolhas continam crescendo sem ligações; em seu meio-tempo elas são comandadas àparte da expansão inflacionária, deixando espaço para que mais bolhas se formem. Esse processo eterno é denominado inflação eterna. Vivemos numa dessas bolhas e podemos observar somente uma pequena parte dela. Não importa quão longe viajemos, não podemos ir além dos limites em expansão de nossa bolha, então, para propósitos práticos, vivemos numa bolha-universo auto-sustentável.
A teoria da inflação explicou algumas das outras características misteriosas do big bang que foram postuladas antes. Ela criou também diversas predições que podem ser medidas, as quais foram confirmadas espetacularmente por observações. Por quanto a inflação se tornou o paradigma mestre da cosmologia.
Outro aspecto chave das novas visões de mundo provém da teoria das cordas, a qual é atualmente a melhor candidata para a teoria fundamental da natureza. A teoria das cordas permite um número muito grande de soluções para descrever os universos-bolha juntamente às diversas propriedades físicas. As quantidades que denominamos constantes da natureza, tais como a massa de partículas elementares, a constante gravitacional de Newton, e outras, possuem valores diferentes em diferentes tipos de bolhas. Agora combine isso com a teoria da inflação. Cada tipo de bolha possui uma determinada probabilidade de se formar num espaço em inflação. Então, inevitavelmente, um número ilimitado de bolhas de todos os tipos possíveis serão formados durante a inflação eterna.
Essa visão do universo, ou multiverso, assim como é chamado, explica os velhos mistérios do por quê as constantes da natureza aparentam estar em sintonia para a emergência da vida. A razão é que observadores inteligentes existem somente naquelas raras bolhas nas quais, por pura coincidência, as constantes ocorrem exatamente para que a vida se desenvolva. O resto do multiverso se mantém estéril, mas não há ninguém lá para se preocupar com isso.
Alguns dos meus colaboradores físicos acham a teoria do multiverso impressionante. Qualquer teoria na física surge ou é derrubada dependendo se as predições estão de acordo com os dados. Mas como podemos verificar a existência de outras bolhas de universo? Paul Steinhardt e George Ellis discutem, por exemplo, que a teoria do multiverso não é científica, pois não pode ser testada, até mesmo seu princípio.
Supreendentemente, os testes observacionais das imagens do multiverso podem ser possíveis. Anthony Aguirre, Matt Johnson, Matt Kleban e outros alertaram que uma colisão de nossa bolha em expansão com outra bolha do multiverso poderia produzir uma marca na radiação cósmica de fundo - um ponto arrendondado de maior ou menor intensidade de radiação. A detecção de tal ponto com um perfil de intensidade previsto poderia fornecer evidências diretas para a existência de outros universos-bolha. A procura está lançada, porém, infelizmente, não há garantias de que as colisões entre as bolhas possam ter ocorrido dentro do nosso horizonte cósmico.
Há ainda outras abordagens que podemos seguir. A idéia é utilizar nosso modelo teórico do multiverso para prever as constantes da natureza esperadas, mensurando-as em nossa região local. Se as constantes variam de uma bolha para outra do universo, seus valores locais não podem ser previstas com certeza, mas ainda podemos fazer predições estatísticas. Podemos criar derivações a partir da teoria de quais valores das constantes têm maior probabilidade de ser medida por um observador comum no multiverso. Assumindo-se que somos esses comuns - a afirmação que denomino de princípio da mediocridade - podemos, então, prever os valores mais prováveis das constantes em nossa bolha.
Essa estratégia tem sido aplicada à densidade da energia no vácuo, também conhecida como "energia escura". Esteven Weingerg notou que em regiões onde a energia escura é grande há uma expansão muito rápida do universo, impedindo a matéria de formar galáxias e estrelas. Os observadores aparentemente não estão presentes nessas regiões. Cálculos demonstram que a maior parte das galáxias (e, então, outros observadores) estão em regiões onde a energia escura é quase da mesma densidade da matéria originada no período da formação das galáxias. As previsões dizem que um valor similar deve ser percebido na nossa parte do universo.
Para a maioria dos físicos essa idéia não é levada a sério, mas para a grande surpresa deles, a energia escura de uma magnitude quase esperada foi detectada em observações astronômicas nos anos de 1990. Essa pode ser nossa primeira evidência de que há de fato um imenso multiverso fora daqui. Isso mudou muitas mentes.
A teoria do multiverso é ainda imatura, e alguns problemas conceituais permanecem a ser resolvidos. Porém, assim como Leonard Susskind escreveu, "Eu poderia apostar que na virada do século XXII os filósofos e os físicos irão olhar nostalgicamente para o presente e relembrar uma era dourada na qual um conceito primitivo e pequeno do século XX sobre o universo deu origem a um [multiverso] maior e melhor... de proporções confusas para a mente."

Fonte: http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=multiverse-the-case-for-parallel-universe
Tradução
Gabriel Shimizu Bassi
Coordenador Sociedade Racionalista USP
www.racionalistausp.wordpress.com
Fonte: Scientific American

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Os assaltantes da consciência


Os assaltantes da consciência


Muitos cometemos o engano de atribuir a Goebbels a idéia da manipulação das massas pela propaganda política. Antes que o ministro de Hitler cunhasse expressões fortes, como Deutschland, erwacht!, Edward Bernays começava a construir a sua excitante teoria sobre o tema.

Carlos Ferreira

Bernays e o Tea Party americano (no Brasil também tem)
Bernays, nascido em Viena, trazia a forte influência de Freud: era seu duplo sobrinho.
Sua mãe foi irmã do pai da psicanálise, e seu pai, irmão da mulher do grande cientista. Na realidade, Bernays teve poucas relações pessoais com o tio. Com um ano de idade transferiu-se de Viena para Nova Iorque, acompanhando seus pais judeus. Depois de ter feito um curso de agronomia, dedicou-se muito cedo a uma profissão que inventou, a de Relações Públicas, expressão que considerava mais apropriada do que “propaganda”. Combinando os estudos do tio sobre a mente e os estudos de Gustave Le Bon e outros, sobre a psicologia das massas, Bernays desenvolveu sua teoria sobre a necessidade de manipular as massas, na sociedade industrial que florescia nos Estados Unidos e no mundo.
O texto que se segue é ilustrativo de sua conclusão: “ A consciente e inteligente manipulação dos hábitos e das opiniões das massas é um importante elemento na sociedade democrática. Os que manipulam esse mecanismo oculto da sociedade constituem um governo invisível, o verdadeiro poder dirigente de nosso país. Nós somos governados, nossas mentes são moldadas, nossos gostos formados, nossas idéias sugeridas amplamente por homens dos quais nunca ouvimos falar. Este é o resultado lógico de como a nossa “sociedade democrática” é organizada. Vasto número de seres humanos deve cooperar, desta maneira acomodada, se eles têm que conviver em sociedade. Em quase todos os atos de nossa vida diária, seja na esfera política ou nos negócios, em nossa conduta social ou em nosso pensamento ético, somos dominados por um relativamente pequeno número de pessoas. Elas entendem os processos mentais e os modelos das massas. E são essas pessoas que puxam os cordões com os quais controlam a mente pública”.
Bernays entendeu que essa manipulação só é possível mediante os meios de comunicação. Ao abrir a primeira agência de comunicação em Nova Iorque, em 1913, aos 22 anos, ele tratou de convencer os homens de negócios que o controle do mercado e o prestígio das empresas estavam “nas notícias”, e não nos anúncios. Foi assim que inventou o famoso press release. Coube-lhe também criar “eventos”, que se tornariam notícias. Patrocinou uma parada em Nova Iorque na qual, pela primeira vez, mulheres eram vistas fumando. Contratou dezenas de jovens bonitas, que desfilaram com suas longas piteiras – e abriu o mercado do cigarro para o consumo feminino. Dele também foi a idéia de que, no cinema, o cigarro tivesse, como teve, presença permanente – e criou a “merchandising”. É provável que ele mesmo nunca tenha fumado morreu aos 103 anos, em 1995.
A prevalência dos interesses comerciais nos jornais e, em seguida, nos meios eletrônicos, tornou-se comum, depois de Bernays, que se dedicou também à propaganda política. Foi consultor de Woodrow Wilson, na Primeira Guerra Mundial, e de Roosevelt, durante o “New Deal”. É difícil que Goebbels não tivesse conhecido seus trabalhos.
A técnica de manipulação das massas é simples, sobretudo quando se conhecem os mecanismos da mente, os famosos instintos de manada, aos quais também ele e outros teóricos se referem. O “instinto de manada” foi manipulado magistralmente pelos nazistas e, também ali, a serviço do capitalismo. Krupp e Schacht tiveram tanta importância quanto Hitler. Mas, se sem Hitler poderia ter havido o nazismo, o sistema seria impensável sem Goebbels. E Goebbels, ao que tudo indica, valeu-se de Bernays, Le Bon e outros da mesma época e de idéias similares.
A propósito do “instinto de manada” vale a pena lembrar a definição do fascismo por Ortega y Gasset: um rebanho de ovelhas acovardadas, juntas umas às outras pêlo com pêlo, vigiadas por cães e submissas ao cajado do pastor. Essa manipulação das massas é o mais forte instrumento de dominação dos povos pelas oligarquias financeiras. Ela anestesia as pessoas – mediante a alienação – ao invadir a mente de cada uma delas, com os produtos tóxicos do entretenimento dirigido e das comunicações deformadas. É o que ocorre, com a demonização dos imigrantes “extracomunitários” nos países europeus, mas, sobretudo, dos procedentes dos países islâmicos.
Acossados pela crise econômica, nada melhor do que encontrar um “bode expiatório” como foram os judeus para Hitler, depois da derrota na Primeira Guerra  e, desesperadamente, organizar nova cruzada para a definitiva conquista da energia que se encontra sob as areias do Oriente Médio. Se essa conquista se fizer, há outras no horizonte, como a dos metais dos Andes e dos imensos recursos amazônicos. Não nos esqueçamos da “missão divina” de que se atribuía Bush para a invasão do Iraque provada com entusiasmo pelo Congresso.
É preciso envenenar a mente dos homens, como envenenada foi a inteligência do assassino de Oslo  e desmoralizar, tanto quanto possível, as instituições do Estado Democrático sempre a serviço dos donos do dinheiro. Quem conhece os jornais e as emissoras de televisão de Murdoch sabem que não há melhor exemplo de prática das idéias de Bernays e Goebbels do que a sua imensa empresa.
São esses mesmos instrumentos manipuladores que construíram o Partido Republicano americano e hoje incitam seus membros a impedir a taxação dos ricos para resolver o problema do endividamento do país, trazido pelas guerras, e a exigir os cortes nos gastos sociais, como os da saúde e da educação. Essa mesma manipulação produziu Quisling, o traidor norueguês a serviço de Hitler durante a guerra, e agora partejou o matador de Oslo.

Carlos Ferreira - Engenheiro, com especialização em Políticas Públicas e Governo pela EPPG-IUPERJ. Atuo na área de energia nuclear. Sou ex-conselheiro do CREA-RJ e do Clube de Engenharia, onde atualmente sou membro do Conselho Editorial.

Fonte: http://www.desenvolvimentistas.com.br/